A intercessão dos Santos |
Perguntas do Internauta |
Dom, 24 de Maio de 2009 22:01 |
Os
protestantes dizem: "Enquanto vocês, católicos, pedem aos
Santos, nós pedimos diretamente a Deus". Gostaria de saber:
como é este processo? Sabemos que Deus é onisciente, tem todo o
conhecimento. Bem, quando pedimos aos Santos, eles pedem a
Deus, sabendo Deus da nossa necessidade? Como funciona quando pedimos
algo aos Santos? Como ocorre essa intercessão dos Santos quando
rogamos a eles? (Márcio)
Márcio,
primeiramente, recomendo a leitura atenta do artigo que
escrevi no link “Doutrina Católica”. O artigo chama-se “Então, a Igreja
adora os Santos?”. Ali, este tema encontra-se bem explanado.
É verdade que somente Jesus Cristo salva: “Não há, debaixo do céu, outro nome dado aos homens pelo qual devamos ser salvos” (At 4,11). Ele é o único Mediador entre Deus, nosso Pai, e a humanidade: “Há
um só Deus, e um só Mediador entre Deus e os homens, um homem,
Cristo Jesus, que se deu em resgate por todos” (1Tm 2,5). Nele nós temos a bênção da graça e da salvação: “Bendito
seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos abençoou
com toda a sorte de bênção espirituais, nos céus, em Cristo. É pelo
sangue deste que temos a redenção, a remissão dos pecados...”
(Ef 1,3.7). Este, é, portanto, um ponto central claríssimo
da fé católica: só Cristo salva e somente Cristo intercede por
nós junto do Pai. Não há outra mediação fora da mediação do
único e absoluto Salvador, Cristo Jesus.
A
primeira coisa importante na questão que foi colocada é
compreender bem o que é um Santo. Segundo a Escritura, somente
Deus é Santo (cf. 1Sm 2,2; Sl 22,3; Is 6,3). A palavra hebraica
“santo” (=kadosh) significa “separado”. Deus é o
Outro, o que está para além de tudo, o que é diverso de toda a
criação, é aquele que não pode ser confundido com as criaturas,
aquele que não pode ser manipulado pelo homem. Deus não está
entre as criaturas: ele é o sustento de tudo, é o fundamento de
tudo. Porque é Santo, Deus é completamente livre, soberano, glorioso.
A Igreja, fiel à Palavra de Deus, afirma, na Oração Eucarística
II: “Na verdade, ó Pai, vós sois Santo e fonte de toda a santidade!”
Sendo o Filho eterno do Pai, e Deus com o Pai, Jesus Cristo é o
Santo de Deus (cf. Mc 1,24; Lc 1,35; At 3,14...). A cada
Domingo a Igreja dirige-se, na Missa, ao Senhor Jesus com estas
palavras: “Só vós sois o Santo, só vós o Senhor, só vós o
Altíssimo, Jesus Cristo, com o Espírito Santo na glória de Deus
Pai”. Sendo o Santo, ele nos santificou com a sua cruz e
ressurreição, pois, ressuscitando, derramou sobre nós o seu
Espírito Santo, Espírito de santificação: “Dizendo isso, soprou
sobre eles e lhes disse: «Recebei o Espírito Santo...” (Jo 20,22). Ao
sermos batizados, recebemos o Espírito Santo do Cristo
ressuscitado, que nos dá uma nova vida: a vida do próprio Deus.
É esta vida nova que nos faz “Santos”: “Vós vos lavastes,
fostes santificados, fostes justificados em nome do Senhor
Jesus Cristo e pelo Espírito Santo” (1Cor 6,11). “Nele (em Cristo)
ele (o Pai) nos escolheu antes da fundação do mundo, para sermos
santos e irrepreensíveis diante dele no amor” (Ef 1,4). Assim,
aqueles que foram batizados em Cristo receberam a santidade de
Cristo porque receberam o Espírito Santo de Cristo, Espírito
santificador. Por isso mesmo muitas vezes São Paulo chama todos
os cristãos de «Santos» (cf. 1Cor 1,2; 2Cor 1,1; Ef 3,8; Fl
4,21...). No entanto o cristão, sendo santo, ou seja,
santificado por Cristo, deve viver como santo. Escrevendo aos Coríntios,
o Apóstolo assim se referia aos batizados: “... àqueles que foram santificados em Cristo Jesus, chamados a ser santos...” (1Cor 1,2). Portanto,
«santo», para a Igreja, é todo cristão! Contudo, damos o nome
de “santo” de um modo todo especial àqueles cristãos, irmãos
nossos - canonizados ou não -, que já estão na Glória. Eles foram
abertos à graça de Cristo, eles disseram “sim” sem reservas à
salvação trazida por Jesus; aceitando completamente Jesus como
Salvador, eles não resistiram à ação do Espírito Santo, eles
viveram seu Batismo até às últimas conseqüências! O «santo» é
um pecador como nós, que lutou para levar Cristo a sério e,
procurando ser fiel à graça de Cristo, viveu o Evangelho. Por isso mesmo
é apresentado pela Igreja como exemplo para todos nós.
Esclarecido
este ponto, vamos à intercessão dos santos. A Escritura nos
ensina que todos os batizados foram revestidos de Cristo e, tornando-se
uma só coisa com ele, são membros do seu Corpo, que é a Igreja.
Ser cristão é estar incorporado, enxertado no Senhor Jesus
ressuscitado: “Todos vós, que fostes batizados em Cristo,
vos revestistes de Cristo... pois todos vós sois um só em
Cristo Jesus” (Gl 3,27); “Vós sois o corpo de Cristo e sois
seus membros, cada um por sua parte” (1Cor 12,27); “Nós somos
muitos, mas formamos um só corpo em Cristo” (Rm 12,27). A vida dos bem-aventurados no céu - e também já aqui na terra a vida de cada batizado - é vida em Cristo: “A graça de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 6,23).
O cristão é aquele que permanece em Cristo, que vive não mais
por si mesmo, mas por Cristo. A seiva, a vida nova da qual
vivem os cristãos é o próprio Espírito Santo do Senhor Jesus
ressuscitado, recebido no batismo: “Aquele que se une ao
Senhor, constitui com ele um só Espírito” (1Cor 6,17); “Pois
fomos todos batizados num só Espírito para ser um só corpo... e todos
bebemos de um só Espírito” (1Cor 12,13). Aparece assim
claramente que os batizados - particularmente os que estão na
Glória - são uma só coisa com Cristo, estão em Cristo, foram
“con-formados” com Cristo, são membros de Cristo, que é Cabeça
de todos. Não há, para aqueles que estão na Glória, outra vida
que não a de Cristo e em Cristo!
Ora,
o Espírito de Cristo ressuscitado em nós, fazendo-nos uma só
coisa com o Senhor Jesus, suscita em nós os bons sentimentos e
as boas obras: tudo de bom que pensamos e fazemos é suscitado
pelo Espírito Santo em nós: “É Deus quem opera em vós o querer e o operar” (Fl 2,13).
É exatamente porque cremos em Cristo, porque estamos unidos a
ele e nele estamos enxertados e incorporados pelo Batismo, que
podemos realizar as obras da fé, daquela fé que atua pela
caridade (cf. Gl 5,6). Quando rezamos, não somos nós que
rezamos: quem ora em nós, quem louva em nós e intercede em nós é o
próprio Espírito do Cristo Jesus ressuscitado: “Assim
também o Espírito socorre a nossa fraqueza. Pois não sabemos o
que pedir como convém; mas o próprio Espírito intercede por nós com
gemidos inefáveis e aquele que perscruta os corações sabe qual é
o desejo do Espírito; pois é segundo Deus que ele intercede
pelos santos” (Rm 8,26-27). É por isso que, já aqui na
terra, pedimos aos nossos irmãos que intercedam por nós.
Dizemos uns aos outros: “Fulano, reze por mim!” O próprio Novo
Testamento recomenda que rezemos uns pelos outros (cf. 2Cor 1,1; Ef
1,16; 6,19; Fl 1,4; Cl 4,12; 1Ts 1,2; 1Ts 5,25; 1Tm 2,1; Tg
5,16). Pedimos a oração de um irmão batizado porque sabemos que
ele ora em Cristo, que esse irmão é uma só coisa com Cristo,
já que é membro do seu Corpo e vive do Espírito do Senhor
ressuscitado, de modo que já não é ele quem ora, mas é Cristo
que ora nele como Mediador único entre nós e Deus.
Com
nossos irmãos que estão na Glória acontece o mesmo. A morte
não nos separa do amor de Cristo nem dos irmãos, não rompe a
comunhão entre os que estão com o Senhor, no céu, e nós,
peregrinos: “Estou convencido de que nem a morte nem a
vida... nem qualquer outra criatura poderá nos separar do amor
de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm
8,38-39). No Senhor todos vivem e permanecem unidos no
amor. Se a morte interrompesse uma tal comunhão em Cristo isso
significaria que ela - a morte - seria mais forte que o amor,
que a vida e que a vitória do Senhor Jesus. Mas, não! Cristo é
mais forte que a morte e o inferno! Desse modo, nossos irmãos
que estão com Cristo (cf. Fl 1,23) na Glória, são plenamente
membros do Corpo do Cristo, vivem do Espírito do Cristo
ressuscitado e participam da única mediação de Cristo! É Cristo quem
intercede neles, de modo que a intercessão dos Santos, amigos
de Cristo, nada mais é que uma admirável manifestação do poder e
da fecundidade da única mediação do Senhor Jesus. Ele é o
único Mediador, que inclui na sua mediação única todos os que
são uma só coisa com ele por serem membros do seu Corpo. A
mediação do Senhor Jesus não é mesquinha: é única, mas não é
exclusivista: ela inclui todos nós: não é exclusiva, mas
inclusiva! Caso contrário, nem nós, que vivemos ainda neste
mundo, poderíamos rezar uns pelos outros, já que isso é também
uma forma de mediação.
Assim,
é em Cristo, como seus membros, no seu Espírito, que os Santos
intercedem ao Pai. A intercessão dos Santos nada mais é que uma
manifestação da única intercessão do Senhor Jesus, que, sendo rico e
potente, suscita em nós a capacidade de participar da sua única
mediação. Os nossos irmãos na Glória são aquela nuvem de
testemunhas de que fala a Epístola aos Hebreus: “Portanto,
também nós, com tal nuvem de testemunhas ao nosso redor,
rejeitando todo o fardo e o pecado que nos envolve, corramos
com perseverança a corrida que nos é proposta, com os olhos
fixos nAquele que é o Autor e Realizador da fé, Jesus” (Hb
12,1-2). São eles que, a exemplo dos primeiros santos mártires,
participando da mediação única do Senhor Jesus, e nessa única
mediação, suplicam em nosso favor, como membros de Cristo:
“Vi sob o Altar as vidas dos que tinham sido imolados por
causa da Palavra de Deus e do testemunho que dela tinham
prestado. E eles clamaram em alta voz: ‘Até quando, ó Senhor
Santo e Verdadeiro, tardarás a fazer justiça, vingando nosso
sangue contra os habitantes da terra?’” (Ap 6,10)
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