Catequese sobre a Igreja - II |
Bento XVI |
Seg, 18 de Maio de 2009 22:27 |
Caros Irmãos e irmãs,
A Carta aos Efésios apresenta a Igreja como um edifício construído «sobre a base dos apóstolos e profetas, sendo a pedra angular o próprio Cristo» (2,20).
No Apocalipse, o papel dos apóstolos, e mais especificamente o dos
Doze, é esclarecido com a perspectiva escatológica da Jerusalém
celeste, apresentada como uma cidade cuja muralha «assenta-se sobre doze pedras, que levam os nomes dos doze apóstolos do Cordeiro» (21,14).
Os Evangelhos coincidem em narrar que o chamado aos apóstolos marcou
os primeiros passos do ministério de Jesus, após o batismo recebido
pelo Batista nas águas do Jordão.
Segundo a narração de Marcos (1,16-20) e de Mateus (4,18-22), o
cenário do chamado aos primeiros apóstolos é o lago da Galiléia.
Jesus acaba de começar a pregação do Reino de Deus, quando seu olhar
dirige-se a dois pares de irmãos: Simão e André, São Tiago e João.
São pescadores, dedicados a seu trabalho cotidiano. Lançam as redes,
reparam-nas. Mas lhes espera outra pesca. Jesus os chama com decisão e
eles o seguem com prontidão: a partir de agora serão «pescadores de
homens» (cf. Mc 1,17; Mt 4,19). Lucas, apesar de seguir a mesma
tradição, oferece uma narração mais elaborada (5,1-11). Mostra o
caminho de fé dos primeiros discípulos, precisando que o convite ao
seguimento lhes chega depois de ter escutado a primeira pregação de
Jesus, e depois de ter experimentado seus primeiros sinais
prodigiosos. Em particular, a pesca milagrosa constitui o contexto
imediato e oferece o símbolo da missão de pescadores de homens que se
lhes confio. O destino destes «chamados», a partir de agora, ficará
intimamente ligado ao de Jesus. O apóstolo é um enviado, mas antes
ainda é um «especialista» em Jesus.
Este aspecto é sublinhado pelo evangelista João com os futuros
apóstolos. Aqui o cenário é diferente. O encontro acontece nas
margens do Jordão. A presença dos futuros discípulos, que como Jesus
vieram da Galiléia para viver a experiência do batismo administrado
por João, ilumina seu mundo espiritual. Eram homens em espera do
Reino de Deus, desejosos de conhecer o Messias, cuja vinda era
anunciada como algo eminente. É-lhes suficiente que João Batista
assinale Jesus como o Cordeiro de Deus (cf. Jo 1,36), para que surja
neles o desejo de um encontro pessoal com o Mestre. O diálogo de
Jesus com seus primeiros dois futuros apóstolos é muito expressivo. À
pergunta: «Que buscais?», respondem com outra pergunta: «Rabbi - que quer dizer “Mestre” - onde moras?». A resposta de Jesus é um convite «Vinde e vede» (cf. Jo 1,38-39).
Vinde para poder ver. A aventura dos apóstolos começa assim, como um
encontro de pessoas que se abrem reciprocamente. Para os discípulos
começa um conhecimento direto do Mestre. Eles vêem onde vive e
começam a conhecê-lo. Não terão de ser arautos de uma idéia, mas
testemunhas de uma pessoa. Antes de ser enviados a evangelizar, terão
de «estar» com Jesus (cf. Marcos 3,14), estabelecendo com ele uma
relação pessoal. Com este fundamento, a evangelização não é mais que
um anúncio do que se experimentou e um convite a entrar no mistério
da comunhão com Cristo (cf. 1Jo 13).
A quem serão enviados os apóstolos? No Evangelho, Jesus parece restringir a Israel sua missão: «Não fui enviado mais que às ovelhas perdidas da casa de Israel» (Mt 15,24). Ao mesmo tempo parece circunscrever a missão confiada aos doze: «A
estes doze Jesus enviou, depois de dar-lhes estas instruções: «Não
tomeis caminho de gentis nem entreis na cidade de samaritanos;
dirigi-vos mais às ovelhas perdidas da casa de Israel» (Mt 10,5).
Uma certa crítica de inspiração racionalista havia visto nestas
expressões a falta de uma consciência universal do Nazareno. Na
realidade, têm de ser entendidas à luz de sua relação especial com
Israel, comunidade da Aliança, em continuidade com a história da
salvação. Segundo a espera messiânica, as promessas divinas, feitas
imediatamente a Israel, chegariam a seu cumprimento quando o próprio
Deus, através de seu Eleito, reunisse seu povo como faz um pastor com
seu rebanho: «Eu virei salvar minhas ovelhas para que não estejam
mais expostas ao perigo... Eu suscitarei para pôr-se à frente um só
pastor que as apascentará, meu servo Davi: ele as apascentará e será
seu pastor. Eu, o Senhor, serei seu Deus, e meu servo Davi será
príncipe no meio deles» (Ez 34,22-24). Jesus é o pastor
escatológico, que reúne as ovelhas perdidas da casa de Israel e sai
em sua busca, pois as conhece e as ama (cf. Lc 15,4-7 e Mt 18,12-14;
cf. também a figura do bom pastor em Jo 10,11ss). Através desta
«reunião» anuncia-se o Reino de Deus a todos os povos: «Assim eu
manifestarei minha glória entre as nações, e todas as nações verão o
juízo que vou executar e a mão que porei sobre elas» (Ez 39,21).
E Jesus segue precisamente este perfil profético. O primeiro passo é
a «reunião» de Israel, para que todos os povos chamados a reunir-se
na comunhão com o Senhor possam viver e crer.
Deste modo, os doze, chamados a participar da própria missão de
Jesus, cooperam com o Pastor dos últimos tempos, dirigindo-se também
antes de tudo às ovelhas perdidas da casa de Israel, ou seja, ao povo
da promessa, cuja reunião é sinal de salvação para todos os povos,
inicio da universalização da Aliança. Longe de contradizer a abertura
universal da ação messiânica do Nazareno, o ter restringido ao
início sua missão e a dos doze a Israel é um sinal profético eficaz.
Após a paixão e a ressurreição de Cristo, este sinal será
esclarecido: o caráter universal da missão dos apóstolos se fará
explícito. Cristo enviará os apóstolos «por todo o mundo» (Marcos 16, 15), a «todos os povos» (Mt 28,19; Lc 24,47), «até os confins da terra» (At 1,8).
E esta missão continua. Sempre continua o mandamento do Senhor de
reunir os povos na unidade de seu amor. Esta é nossa esperança e este
é também nosso mandamento: contribuir a essa universalidade, a esta
verdadeira unidade na riqueza das culturas, em comunhão com nosso
verdadeiro Senhor Jesus Cristo.
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