sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Catequese sobre a Igreja - IV

Catequese sobre a Igreja - IV PDF Imprimir E-mail
Bento XVI
Seg, 18 de Maio de 2009 22:26
 
Queridos irmãos e irmãs,         
            Na nova série de catequeses, começada há algumas semanas, queremos considerar as origens da Igreja para compreender o desígnio originário de Jesus, e deste modo compreender o essencial da Igreja, que permanece com o passar do tempo. Queremos compreender também o porquê de nosso ser na Igreja e como temos de nos comprometer a vivê-lo ao início de um novo milênio cristão.  
            Ao refletir sobre a Igreja nascente, podemos descobrir dois aspectos: um primeiro aspecto é sublinhado vigorosamente por Santo Irineu de Lião, mártir e grande teólogo de finais do século II, o primeiro que nos deixou uma teologia em certo sentido sistemática. Santo Irineu escreve: «Onde está a Igreja, ali está também o Espírito de Deus; e onde está o Espírito de Deus, ali está a Igreja e toda graça; pois o Espírito é a verdade» (Adversus haereses III, 24, 1: PG 7, 966). Portanto, existe uma relação íntima entre o Espírito Santo e a Igreja. O Espírito Santo edifica a Igreja e lhe dá a verdade, infunde - como diz São Paulo - nos corações dos crentes o amor (cf. Rm 5,5). 
            Mas também há um segundo aspecto. Esta relação íntima com o Espírito não anula nossa humanidade com toda sua fraqueza e, deste modo, a comunidade dos discípulos experimenta desde os inícios não só a alegria do Espírito Santo, a graça da verdade e do amor, mas também a provação, constituída sobretudo pelos contrastes entre as verdades de fé com as conseguintes lacerações da comunhão. Assim como a comunhão do amor existe desde o início e existirá até o final (cf. 1Jo 1,1ss), do mesmo modo, por infelicidade, desde o início irrompe também a divisão. Não temos de nos surpreender pelo fato de que hoje também exista: «Saíram dentre nós - diz a Primeira Carta de João -; mas não eram dos nossos. Se tivessem sido dos nossos, haveriam permanecido conosco. Mas sucedeu assim para pôr de manifesto que nem todos são dos nossos» (2,19). Portanto, sempre existe o perigo, nas vicissitudes do mundo e também nas debilidades da Igreja, de perder a fé, e assim, de perder também o amor e a fraternidade. Portanto, é um dever preciso de quem crê na Igreja do amor e quer viver nela reconhecer também este perigo e aceitar que não é possível a comunhão com quem se afastou da doutrina da salvação (cf. 2Jo 9-11). 
            Que a Igreja nascente fosse claramente consciente destas tensões possíveis na experiência da comunhão o mostra muito bem a Primeira Carta de João: não há outra voz no Novo Testemunho que se levante com tanta força para sublinhar a realidade do dever do amor fraterno entre os cristãos; mas essa mesma voz dirige-se com drástica severidade aos adversários, que foram membros da comunidade e que já não são. A Igreja do amor é também a Igreja da verdade, entendida antes de tudo como fidelidade ao Evangelho confiado pelo Senhor Jesus aos seus. A fraternidade cristã nasce pelo fato de ser filhos do mesmo Pai pelo Espírito de verdade: «Com efeito, todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus» (Rm 8, 4). Mas a família dos filhos de Deus, para viver na unidade e na paz, necessita de alguém que a custodie na verdade e a guie com sábio e autorizado discernimento: isto é o que está chamado a fazer o ministério dos Apóstolos. E aqui chegamos a um ponto importante. A Igreja é totalmente do Espírito, mas tem uma estrutura, a sucessão apostólica, que tem a responsabilidade de garantir a permanência da Igreja na verdade doada por Cristo, da qual também procede a capacidade do amor. O primeiro sumário dos Atos dos Apóstolos expressa com grande eficácia a convergência destes valores na vida da Igreja nascente: «Iam assiduamente para o ensino dos apóstolos, à comunhão (koinonia), à fração do pão e às orações» (At 2,42). A comunhão nasce da fé suscitada pela pregação apostólica, alimenta-se da fração do pão e da oração, e se expressa na caridade fraterna e no serviço. Encontramo-nos ante a descrição da comunhão da Igreja nascente na riqueza de seus dinamismos internos e de suas expressões visíveis: o dom da comunhão está custodiado e é promovido em particular pelo ministério apostólico, que por sua vez é dom para toda a comunidade.   
            Os apóstolos e seus sucessores são, portanto, os custódios e as testemunhas autorizadas do depósito da verdade entregue à Igreja, e são também os ministros da caridade: dois aspetos que vão juntos. Têm de pensar sempre no caráter inseparável deste duplo serviço, que na realidade é o mesmo: verdade e caridade, reveladas e doadas pelo Senhor Jesus. Neste sentido, realizam antes de tudo um serviço de amor: a caridade que têm de viver e promover não pode separar-se da verdade que custodiam e transmitem. A verdade e o amor são duas caras do mesmo dom: que procede de Deus e que graças ao ministério apostólico é custodiado na Igreja e nos chega até nosso presente! Através do serviço dos apóstolos e seus sucessores também nos alcança o amor de Deus Trindade para comunicar-nos a verdade que nos faz livres (cf. Jo 8,32)! Tudo isto que vemos na Igreja nascente leva-nos a rezar pelos sucessores dos apóstolos, por todos os bispos e pelos sucessores de Pedro, para que sejam realmente apóstolos de Cristo, para que sua luz, a luz da verdade e da caridade não se apague nunca na Igreja e no mundo.

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