sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Catequese sobre a Igreja - III

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Bento XVI
Seg, 18 de Maio de 2009 22:27
 
Queridos irmãos e irmãs,         
Através do ministério apostólico, a Igreja, comunidade reunida pelo Filho de Deus vindo na carne, viverá através dos tempos edificando e nutrindo a comunhão em Cristo e no Espírito, à qual todos somos chamados e na qual podem experimentar a salvação dada pelo Pai. Os Doze – como diz o Papa Clemente, terceiro sucessor de Pedro, ao final do século I – se preocuparam, de fato, em constituir sucessores (Cf. 1Clemente 42,4) para que a missão que se lhes foi confiada continuasse depois de sua morte. No decorrer dos séculos, a Igreja, organicamente estruturada sob a guia dos legítimos pastores, assim continuou vivendo no mundo como mistério de comunhão, no qual se reflete em certo sentido a mesma comunhão trinitária, o mistério do próprio Deus.  
            Já o apóstolo Paulo menciona este supremo manancial trinitário quando deseja aos seus cristãos: «A graça do Senhor Jesus, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo sejam com todos vós» (2Cor 13,13). Estas palavras, provável eco do culto da Igreja nascente, evidenciam como o dom gratuito do amor do Pai em Jesus Cristo se realiza e se expressa na comunhão que atua o Espírito Santo. Esta interpretação, baseada no estreito paralelismo que estabelece o texto entre os três genitivos («a graça do Senhor Jesus Cristo, o amor de Deus e a comunhão do Espírito Santo»), apresenta a «comunhão» como dom específico do Espírito, fruto do amor entregue por Deus Pai e da graça oferecida pelo Senhor Jesus.  
            Por outro lado, o contexto imediato, caracterizado pela insistência na comunhão fraterna, nos leva a ver na «koinonia» do Espírito Santo não só a «participação» na vida divina de maneira quase individual, cada um por si, mas também logicamente a «comunhão» entre os crentes, que o Espírito mesmo suscita como seu artífice e principal agente (Cf. Fl 2, 1). Poderia se afirmar que graça, amor e comunhão, referidos respectivamente a Cristo, ao Pai e ao Espírito, são aspectos diversos da única ação divina por nossa salvação, ação que cria a Igreja e que faz da Igreja – como diz São Cipriano no século III – «uma multidão reunida pela unidade do Pai, do Filho e do Espírito Santo» (De Orat. Dom., 23: PL 4, 536, citado na Lumen gentium 4).  
            A idéia da comunhão como participação na vida trinitária é iluminada com particular intensidade no Evangelho de João, onde a comunhão de amor que une ao Filho com o Pai e com os homens é, ao mesmo tempo, o modelo e a fonte da comunhão fraterna, que deve unir os discípulos entre si: «Amai-vos uns aos outros como eu vos amei» (Jo 15,12; cf. 13,34). «Que eles sejam um, como nós somos um» (Jo 17,21.22). Portanto, comunhão dos homens com o Deus Trinitário e comunhão dos homens entre si. No tempo da peregrinação terrena, o discípulo, através da comunhão com o Filho, pode participar já na Sua vida divina e na do Pai: «nós estamos em comunhão com o Pai e com seu Filho Jesus Cristo» (1Jo 1,3). Esta vida de comunhão com Deus e entre nós é a finalidade própria do anúncio do Evangelho, a finalidade da conversão ao cristianismo: «o que vimos e ouvimos, vos anunciamos, para que também vós estejais em comunhão conosco» (1Jo 1,3). Portanto, esta dupla comunhão com Deus e entre nós é inseparável. Onde se destrói a comunhão com Deus, que é comunhão com o Pai, com o Filho e com o Espírito Santo, se destrói também a raiz e a fonte da comunhão entre nós. E onde não se vive a comunhão entre nós, tampouco pode ser viva e verdadeira a comunhão com o Deus Trinitário, como escutamos.
            Demos agora um ulterior passo. A comunhão – fruto do Espírito Santo – se alimenta do Pão eucarístico (Cf. 1Cor 10,16-17) e se expressa nas relações fraternas, em uma espécie de antecipação no mundo futuro. Na Eucaristia Jesus nos alimenta, nos une com Ele, com o Pai e com o Espírito Santo e entre nós, e esta rede de unidade que abraça o mundo é uma antecipação do mundo futuro em nosso tempo. Dessa forma, sendo antecipação do mundo futuro, a comunhão é um dom que tem também conseqüências muito reais, nos faz sair de nossas solidões, do fechamento em nós mesmos, e nos permite participar no amor que nos une a Deus e entre nós. É fácil compreender a grandeza deste dom, se pensamos nas divisões e conflitos que afligem às relações entre indivíduos, grupos e povos inteiros. E se não há o dom da unidade no Espírito Santo, a divisão da humanidade é inevitável. A «comunhão» é verdadeiramente uma boa nova, o remédio que nos deu o Senhor contra a solidão que hoje ameaça a todos, o dom precioso que nos faz sentir acolhidos e amados em Deus, na unidade de seu Povo, reunido no nome da Trindade; é a luz que faz resplandecer à Igreja como sinal levantado entre os povos: «Se dizemos que estamos em comunhão com ele, e caminhamos nas trevas, mentimos e não praticamos a verdade. Mas se caminhamos na luz, como ele mesmo está na luz, estamos em comunhão uns com os outros» (1Jo 1,6-7). A Igreja se apresenta assim, apesar de todas as fragilidades humanas que pertencem a sua fisionomia histórica, uma maravilhosa criação de amor, feita para tornar Cristo próximo a todo homem e a toda mulher que queira verdadeiramente encontrá-lo, até o final dos tempos. E na Igreja o Senhor permanece sempre contemporâneo a nós. A Escritura não é uma coisa do passado. O Senhor não fala no passado, mas fala no presente, fala hoje conosco, nos dá luz, nos mostra o caminho da vida, nos dá comunhão e assim nos prepara e nos abre à paz.

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