Catequese sobre a Igreja - XVI |
Bento XVI |
Seg, 18 de Maio de 2009 22:20 |
Filipe
Prosseguindo
no delineamento das fisionomias dos vários Apóstolos, como fazemos há
algumas semanas, hoje encontramos Filipe. Nas listas dos Doze, ele é
sempre colocado no quinto lugar (assim em Mt 10, 3; Mc 3, 18; Lc 6,
14; Act 1, 13), portanto substancialmente entre os primeiros.
Apesar
de Filipe ter origens hebraicas, o seu nome é grego, como o de André,
e isto é um pequeno sinal de abertura cultural que não se deve
subestimar. As notícias que temos sobre ele são-nos fornecidas pelo
Evangelho de João. Ele provinha do mesmo lugar de origem de Pedro e de
André, isto é, de Batsaida (cf. Jo 1, 44), uma pequena cidade
pertencente à tetrarquia de um dos filhos de Herodes, o Grande, também
ele chamado Filipe (cf.Lc3,1).
O
Quarto Evangelho narra que, depois de ter sido chamado por Jesus,
Filipe encontra Natanael e diz-lhe: "Encontrámos aquele sobre quem
escreveram Moisés, na Lei, e os Profetas: Jesus, filho de José de
Nazaré" (Jo 1, 45). Natanael dá uma resposta bastante céptica ("De
Nazaré pode vir alguma coisa boa?"), perante a qual Filipe não se
desencoraja e responde com determinação: "Vem e verás!" (Jo 1, 46).
Nesta resposta, breve mas clara, Filipe manifesta as características
da verdadeira testemunha: não se contenta em propor o anúncio, como
uma teoria, mas interpela directamente o interlocutor sugerindo-lhe
que faça ele mesmo uma experiência pessoal do que foi anunciado. Os
mesmos dois verbos são usados pelo próprio Jesus quando dois
discípulos de João Baptista se aproximam dele para lhe perguntar onde
mora. Jesus responde: "Vinde ver" (cf. Jo 1, 38-39).
Podemos
pensar que Filipe se dirija também a nós com aqueles dois verbos que
exigem um envolvimento pessoal. Também a nós diz o que dissera a
Natanael: "Vem e verás". O Apóstolo convida-nos a conhecer Jesus de
perto. De facto, a amizade, o verdadeiro conhecer o outro, precisa da
proximidade, aliás, de certa forma vive dela. De resto, não se deve
esquecer que, segundo o que escreve Marcos, Jesus escolheu os Doze com
a finalidade primária que "andassem com Ele" (Mc 3, 14), ou seja, que
partilhassem a sua vida e aprendessem directamente dele não só o
estilo do seu comportamento, mas sobretudo quem era Ele realmente. Com
efeito, só assim, participando na sua vida, o podiam conhecer e depois
anunciar. Mais tarde, na Carta de Paulo aos Efésios, ler-se-á que o
importante é "aprender de Cristo" (4, 20), portanto, não só e não tanto
ouvir os seus ensinamentos, as suas palavras, mas ainda mais
conhecê-lo pessoalmente, a sua humanidade e divindade, o seu mistério,
a sua beleza. De facto, Ele não é só um Mestre, mas um Amigo, ou
melhor, um Irmão. Como poderíamos conhecê-lo profundamente
permanecendo distantes? A intimidade, a familiariedade, o habitual
fazem-nos descobrir a verdadeira identidade de Jesus Cristo. Portanto:
é precisamente isto que nos recorda o apóstolo Filipe. E convida-nos a
"vir", a "ver", isto é, a entrar num contacto de escuta, de resposta e
de comunhão de vida com Jesus dia após dia.
Depois,
por ocasião da multiplicação dos pães, ele recebeu de Jesus um pedido
específico e surpreendente: onde era possível comprar o pão para
saciar a fome de todo o povo que o seguia (cf. Jo 6, 5). Então Filipe
respondeu com muito realismo: "Duzentos denários de pão não chegam
para cada um comer um bocadinho" (Jo 6, 7). Vêem-se aqui a praticidade
e o realismo do Apóstolo, que sabe julgar as reais consequências de
uma situação. Depois, como correram as coisas nós sabemo-lo. Sabemos
que Jesus tomou os pães e, depois de ter rezado, distribuiu-os.
Assim
realizou-se a multiplicação dos pães. Mas é interessante que Jesus se
tenha dirigido precisamente a Filipe para obter uma primeira
indicação sobre o modo de resolver o problema: sinal evidente de que
ele fazia parte do grupo limitado que o circundava. Noutro momento,
muito importante para a história futura, antes da Paixão, alguns
Gregos que se encontravam em Jerusalém para a Páscoa "foram ter com
Filipe... e pediram-lhe: "Senhor, nós queremos ver Jesus!". Filipe foi
dizer isto a André; André e Filipe foram dizê-lo a Jesus" (Jo 12,
20-22). Mais uma vez, temos a indicação de um seu prestígio especial no
âmbito do colégio apostólico. Sobretudo, neste caso, ele serve de
intermediário entre o pedido de alguns Gregos provavelmente falava o
grego e pôde disponibilizar-se como intérprete e Jesus; Mesmo se ele
se une a André, o outro Apóstolo com um nome grego, é contudo a ele
que aquelas pessoas desconhecidas se dirigem. Isto ensina-nos a estar
também nós sempre prontos, tanto a ouvir pedidos e invocações, de onde
quer que venham, como a orientá-los para o Senhor, o único que os
pode satisfazer plenamente. Com efeito, é importante saber que nós não
somos os destinatários últimos das orações de quem nos aproxima, mas é
o Senhor: para ele devemos orientar todo aquele que se encontre em
necessidade. Então: cada um de nós deve ser um caminho aberto para
ele!
Há
depois outra ocasião completamente particular, na qual Filipe entra
em cena. Durante a Última Ceia, tendo Jesus afirmado que conhecê-lo
significa também conhecer o Pai (cf. Jo 14, 7), Filipe pede quase
ingenuamente: "Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta!" (Jo 14,
8). Jesus responde-lhe com um tom de indulgente reprovação: "Há tanto
tempo que estou convosco, e não me ficaste a conhecer, Filipe? Quem me
vê, vê o Pai. Como é que me dizes, então, "mostra-nos o Pai"? Não
crês que Eu estou no Pai e o Pai está em Mim?... Crede-me: Eu estou no
Pai e o Pai está em Mim" (Jo 14, 9-11). Estas palavras são as mais
nobres do Evangelho de João. Elas contêm uma profunda revelação. No
final do Prólogo do seu Evangelho, João afirma: "A Deus jamais alguém o
viu. O Filho Unigénito, que é Deus e está no seio do Pai, foi Ele
quem o deu a conhecer" (Jo 1, 18). Pois bem, aquela afirmação, que é
do evangelista, é retomada e confirmada pelo próprio Jesus. Mas com
uma nova característica. De facto, enquanto o Prólogo de João fala de
uma intervenção esclarecedora de Jesus mediante as palavras do seu
ensinamento, na resposta a Filipe Jesus faz referência à própria
pessoa como tal, dando a entender que é possível compreendê-lo não só
mediante o que diz, mas ainda mais mediante o que ele simplesmente é.
Para
nos expressarmos segundo o paradoxo da Encarnação, podemos dizer que
Deus se conferiu um rosto humano, o de Jesus, e por conseguinte de
agora em diante, se verdadeiramente queremos conhecer o rosto de Deus,
devemos contemplar o rosto de Jesus! No seu semblante vemos realmente
quem é e como é Deus!
O
evangelista não nos diz se Filipe compreendeu plenamente a frase de
Jesus. Sem dúvida, ele dedicou-lhe totalmente a própria vida. Segundo
algumas narrações posteriores (Actos de Filipe e outros), o nosso
Apóstolo teria evangelizado primeiro na Grécia e depois na Frígia onde
enfrentou a morte, em Herápoles, com um suplício descrito
diversamente como crucifixão ou lapidação.
Desejamos concluir a nossa reflexão recordando a finalidade para a
qual deve tender a nossa vida: encontrar Jesus como o encontrou
Filipe, procurando ver nele o próprio Deus, o Pai celeste. Se este
compromisso viesse a faltar, seríamos remetidos sempre e só para nós
como num espelho, e estaríamos cada vez mais sós! Ao contrário, Filipe
ensina-nos a deixar-nos conquistar por Jesus, a estar com Ele e a
convidar também outros a partilhar esta companhia indispensável. E
vendo-o, encontrando Deus, encontrar a verdadeira vida. |
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